Óbidos tornou-se, nos últimos dez anos, a residência temporária de um Pai Natal especial. Com raízes cristãs e inspirado pela história de São Nicolau, o protagonista desta jornada celebra uma década de encontros emocionantes e memoráveis na Vila Natal.
1 – Como é celebrar 10 anos de Pai Natal, em Óbidos?
Dez anos passam muito depressa… Parece que foi ontem que iniciei esta aventura de personificar a figura mítica do Pai Natal mas com uma matriz cristã cujas raízes passam pelo São Nicolau cuja história é muito interessante. Ao longo destes anos tenho vindo a descobrir a riqueza dessa história e procuro transmiti-la a todos os que me procuram no Óbidos Vila Natal.
2 – O que o leva a encarar este espírito natalício ano após ano?
Sempre senti na minha vida uma forte ligação ao Natal. Em casa, desde que me lembro, celebrava em família esta quadra, mantendo tradições que hoje não quero que acabem. O ambiente de harmonia familiar, o entusiasmo das crianças em torno da ideia das prendas do Menino Jesus, a “Missa do Galo”, o jantar do peru recheado, a árvore de Natal, as decorações cheias de luz e, sobretudo, o Presépio, fazem parte do meu imaginário, da minha infância e juventude que me têm acompanhado ao longo da vida. Por tudo isso, não é difícil entender que o espírito natalício se reacenda a cada ano.
3 – Sabemos que foi a sua filha que o encorajou, como é que a restante família reagiu e continua a encarar este papel?
Pelo que acabei de dizer, foi com naturalidade que toda a família se reviu neste meu papel de Pai Natal. Como sempre procurei fazer perdurar a tradição, e toda a família comunga do mesmo espírito, o desafio que me foi lançado não podia ter outra resposta que não fosse o meu sim.
Numa época em que impera o ‘politicamente correto’, o respeito preconceituoso, o ‘cinzentismo’ de ideias, fiel aos meus princípios religiosos, teimo em me apresentar como um Pai Natal de matriz cristã, um Pai Natal mais tipo S. Nicolau do que o velhinho barbaças vestido da cor de um refrigerante patrocinador.
Ora, como a minha família partilha destes meus princípios, é com simplicidade que todos aceitam, e até sentem algum orgulho, nesta minha missão.
4 – Dos 14 netos, quais já descobriram este segredo de Natal e como reagiram?
Todos sabem que o avô é Pai Natal! Presumo que, devido a só ter dois anos, apenas a minha bisneta não se tenha ainda apercebido dessa realidade. Sabem que sou “O” Pai Natal, não que represento um papel teatral e têm orgulho nisso.
5 – É um dos Pai Natal mais conhecidos do País, como se prepara para esta época?
Apenas deixo de aparar a barba desde setembro, procuro nos canais da TV dedicados às crianças os anúncios de brinquedos e procuro inteirar-me dos preços. Tento manter-me atualizado relativamente às “tecnologias” e outras novidades de forma a entender o que as crianças e adolescentes me pedem.
6 – Qual a melhor parte de contactar com tantas crianças e famílias durante estes dias?
O melhor de tudo é o brilho nos olhos e os sorrisos das crianças, os abracinhos de ternura e reconhecimento. Não sei o que faço ou o que digo, mas por vezes vejo pais, mães e avós de lagriminha no olho… Talvez seja a saudade de tempos passados, talvez seja apenas a magia do Natal a funcionar… mas é bom!
Por vezes digo que não moro na Lapónia e muito menos no polo Norte, mas que “moro sim na cabeça das pessoas que acreditam em mim”. O efeito, sobretudo nos adultos, é sempre espetacular.
7 – Tem alguma história ou lembrança especial de algum Natal aqui em Óbidos?
Todos os anos acontecem coisas especiais, mas não posso deixar de me emocionar com a lembrança de algo que aconteceu logo no primeiro ano de Pai Natal.
Ao receber um grupo de um ATL, depois de ter falado sobre o significado do Natal aquelas crianças e de lhes desejar felicidades e boas prendas, quando se despediam do Pai Natal uma menina com um ar muito sério e de olhos tristes disse que nunca tinha recebido uma prenda.
Na ocasião (ainda talvez por falta de experiência) apenas pude balbuciar que tivesse esperança… O rosto triste dela deixou-me tão acabrunhado que, no dia seguinte, não pude deixar de desabafar com a equipa organizadora. Nada sabia, nem nome da criança, nem de onde vinha, nada… Mas, numa crescente onda de solidariedade, numa autêntica investigação policial, lá se conseguiu saber onde se sediava o ATL e se conseguiu obter fotos da visita o que permitiu identificar a criança e sua morada.
Com base nessa identificação, obtivemos dos serviços da Segurança Social a confirmação das carências económicas da família. Desse modo, cada um colaborou como pôde na compra de uma bicicleta. Mas depois pôs-se a questão: e então os outros irmãos? Com mais um esforço lá se adquiriram mais umas prendinhas.
Depois foi uma comitiva num carro do Município de Óbidos até Alverca entregar as prendas. Não será difícil imaginar a surpresa. Difícil é descrevê-la…
8 – Qual foi o pedido mais emocionante que já ouviu?
De entre muitíssimos emocionantes, este: – Pai Natal, por favor não deixes a minha mãe morrer. Está no IPO… O pai que a tinha acompanhado chorava em silêncio.
O que dizer face a este pedido lancinante? Fui dizendo que não era a mim que devia pedir, mas que os ajudaria a pedir a Deus. Rezámos e chorámos juntos pedindo a Deus que a ajudasse e, perante a inevitabilidade da natureza, que se transformasse numa estrelinha que tivesse sempre presente nas suas vidas. Saíram ambos com um sorriso triste, mas também com o espírito tranquilo. Fiquei devastado.
Não sei o que se passou depois com eles, mas ao longo destes anos já passados nunca mais me esqueci deles três nas minhas orações.
9 – Além dos pedidos emocionantes, deve haver alguns muito engraçados. Conte-nos alguns.
Todos os dias há pedidos que nos fazem sorrir e até gargalhar. Ontem um puto de cinco anos com um ar de entendido pediu um Iphone 15 da Apple. Quando lhe retorqui que não podia porque era muito caro, olhou-me sério e disse: Tá bem, então quero um estojo de lápis de cores. E ficou todo satisfeito quando disse que isso é era um excelente pedido. Ficou ele e os pais…
Um bebé de dois anos pediu uma prenda azul…
Uma menina de quatro anos queria que lhe desse a gata da vizinha…
Uma outra, talvez com dois anos, o que queria muito era uma fralda nova. De facto estava pestilenta, coitadinha.
10 – Qual a sua mensagem de Natal para este ano?
A de sempre: Que este ano aprendamos o verdadeiro sentido da palavra humanidade e vivamos todos em harmonia e paz!